É crescente o número de jovens empreendedores no Brasil, e 70% deles abrem uma empresa por identificar uma boa oportunidade de mercado.

Por Cléia Schmitz

Nos tempos da resistência à ditadura militar no Brasil, o movimento estudantil defendia que a revolução viria necessariamente da força dos jovens, aqueles que ainda têm tudo a conquistar e nada a perder. “Não confie em ninguém com mais de 30”, se dizia então. Hoje essa ideia pode ser transportada para o mundo dos negócios, onde cada vez mais jovens com cara, coragem e ideias inovadoras na cabeça respondem por negócios que estão revolucionando o jeito de se fazer as coisas. No Brasil, eles já são 25% do total de empreendedores, segundo a pesquisa Global Entrepreneurship Monitor (GEM) de 2008. Mas o que chama atenção nesse estudo é que cerca de 70% desses jovens decidiram abrir um negócio não por mera necessidade, mas por perceber uma oportunidade de mercado.
Seja no Brasil ou no mundo, o universo da internet parece ser uma fonte inesgotável de oportunidades para jovens empreendedores. Com apenas 19 anos de idade, o norte-americano Mark Zuckerberg criou o site de relacionamento Facebook e, hoje, aos 25, comanda um negócio com mais de 250 milhões de usuários ativos. Em 2009, entrou na lista Forbes dos 400 mais ricos da América. Por aqui, os fundadores do Buscapé, serviço de busca de produtos e pesquisa de preço, anunciaram em setembro a venda de 91% do negócio à Naspers. Valor pago: US$ 342 milhões. É um volume considerável, mas surpreende ainda mais se levarmos em conta que a empresa foi criada há 10 anos por quatro jovens universitários (Romero Rodrigues, Rodrigo Borges, Ronaldo Morita e Mario Letelier) que, na época, tinham 20 e poucos anos e investiam cerca de R$ 100 mensais no negócio.
Histórias como essas povoam o imaginário de muitos jovens, que sonham em criar novas minas de dinheiro. Mas o mundo real é feito mesmo de casos como o de Anna Kaebisch. Em 2007, aos 30 anos, ela abriu as portas de sua primeira loja de chocolates artesanais sofisticados, a Kaebisch Schokoladen. Um sonho de quem aos dez anos já fazia seu próprio brigadeiro e, aos 15, vendia ovos de Páscoa e bombons para festas de amigas. Hoje a empresa tem duas lojas em Brasília, prepara-se para abrir a terceira unidade na cidade e estuda a expansão para o Estado de São Paulo em 2010. “Para mim, o segredo continua sendo aquele que sempre ouvi dos mais velhos: quando você trabalha no que gosta a chance de dar certo é muito maior porque você faz com empenho e dedicação”, afirma Anna.
A paixão pelo chocolate levou a empresária a investir em cursos na França e na Bélgica. Hoje ela é uma chef chocolatier que não abre mão de fazer cada um dos produtos vendidos na Schokoladen. Tanta dedicação faz sentido, afinal, “é pelo estômago” que Anna conquista seus clientes. Quem compra indica para os amigos, transformando o sobrenome Kaebisch em marca de chocolate de primeira linha. Aliás, é a preocupação com a qualidade que tem segurado a expansão da marca. “Quando resolvi abrir a loja, queria oferecer ao consumidor um chocolate tratado como uma joia”, informa Anna, que importa a matéria-prima da Bélgica. A empresária conta que já recebeu muitas propostas para abertura de franquias, inclusive de Portugal, mas antes quer formatar muito bem o negócio para ter certeza de que vai continuar oferecendo os mesmos produtos de hoje.
“Ao contrário do que muita gente pensa, o jovem é disciplinado e obstinado quando quer alcançar o sucesso”, afirma Marcus Riz¬zo, especialista em franquia. O consultor é autor de uma pesquisa divulgada neste segundo semestre que mostra um crescimento de 17% no número de franqueados brasileiros com menos de 25 anos. São 12 mil jovens – 16,10% do total de franqueados. Se depender da vontade desse grupo, o percentual deve continuar aumentando. O índice de jovens que declararam ter vontade de abrir uma franquia aumentou 50,55% em relação ao estudo feito no ano anterior. Três razões foram apontadas na pesquisa: o desejo de sucesso rápido, a segurança do empreendimento e a possibilidade de entrar no negócio sem experiência prévia.
Para Rizzo, apesar de contraditório – quem quer segurança abre mão do sucesso rápido e quem quer sucesso abre mão da segurança – esse resultado mostrou uma ansiedade tipicamente apresentada por jovens. O consultor ressalta ainda que estudar e buscar um emprego definitivamente deixou de ser a única alternativa. “Muitos jovens entram na faculdade já com o desejo de montar um negócio próprio e, nesta condição, as franquias passaram a ser um objeto de desejo”, avalia Rizzo. Para ele, o sistema de franchising tem muito a ganhar com o crescimento de franqueados jovens. “Se por um lado as franquias operadas por jovens perdem pela falta de maturidade, especialmente de vida para lidar com situações complexas, ganharão em vitalidade para fazer acontecer cada negócio”, afirma Rizzo.
A ousadia costuma ser uma marca bem forte de quem empreende cedo. E esse é um dos motivos que faz com que a empresária Leiza Oliveira, proprietária da rede de franquias Minds Idiomas, dê preferência a candidatos jovens na seleção de seus franqueados. “Eles não têm medo de romper barreiras e se esforçam muito para alcançar resultados e superar metas”, justifica. Entre as 18 franquias da rede, 13 são gerenciadas por jovens com idade entre 23 e 28 anos. Leiza ressalta que, no caso do sistema de franchising como da Minds, a experiência não é tão importante porque a rede faz um treinamento específico para os franqueados. “Às vezes é até melhor que o candidato nunca tenha trabalhado numa escola de idiomas para não chegar cheio de vícios. Para nós, o importante é que ele tenha perfil empreendedor”, afirma à empresária.
Mas será que é possível realizar o desejo de empreender se tornando um franqueado? Para Marcus Rizzo, a resposta é não. “Um empreendedor deve montar seu próprio negócio porque um franqueado não inventa nada, compra tudo pronto e testado”, argumenta. Na opinião do consultor, um empreendedor é corajoso, independente, visionário e, em geral, corre muitos riscos. Em contrapartida, um franqueado tem que ser mais cauteloso, aberto para ser dirigido, mais metódico e corre menos riscos. “Se você tiver experiência em determinado negócio, nem pense numa franquia. Certamente a sua experiência vai entrar em choque com a experiência do franqueador. Você estará comprando a curva de aprendizagem de um negócio pronto e anteriormente testado e de sucesso comprovado”, conclui Rizzo.
Hoje ele tem certeza que conseguiu seu objetivo. No ano passado, o faturamento da rede aumentou 50,51% em relação a 2007. A previsão de crescimento para 2009 é de 40%. A partir de 2010, a Overboard entra numa nova fase de expansão através do sistema de franchising, adotado em 2008. A meta é abrir cinco novas franquias nos próximos 12 meses, com possibilidade de chegar a outros estados. É uma conquista e tanto para quem não poupou sacrifícios para conseguir empreender. Nos dois primeiros anos do negócio, Perez acumulou o trabalho na Overboard com o emprego na Sadia. “Eu não dormia mais de cinco horas por noite”, lembra. Para conseguir dinheiro, vendeu o carro e pediu ajuda ao “tio Paulo” (Paulo Aparecido Perez Martins, sócio da empresa). “Quando pedi um empréstimo, ele me propôs sociedade e disse: ‘Se der certo, ganhamos juntos, se der errado, perdemos juntos’.”
Perez recorda que um dos maiores problemas foi à falta de crédito de confiança do mercado. No início, as grandes marcas de surfwear não queriam vender para a Overboard. Hoje são grandes parceiras. “O problema não era nem tanto eu ser jovem, mas desconhecido no segmento”, explica. Por isso, o empresário acredita que a persistência é uma das maiores virtudes de um empreendedor e que, nessas horas, o apoio da família é fundamental. Ele conta que seus pais ficaram receosos no começo, mas um ano e meio depois sua mãe foi trabalhar na Overboard, onde ficou 11 anos. “Quem tem um sonho deve realizá-lo, mas tem que fazer isso com os dois pés no chão. É claro que o risco sempre vai existir, mas ele precisa ser dosado para que tudo dê certo”, ensina Perez.
Mas e qual será a vantagem de se começar jovem? Para Eduardo Vilas Boas, é vantajoso na medida em que se aprende mais ao longo da vida. “A tendência é que no futuro tenhamos empreendedores bem mais preparados”, acredita. Na opinião de Varela, a vantagem é que o jovem tem mais tempo de errar e corrigir seus erros. “Em muitos casos, eles empreendem com dinheiro da família, o que permite quebrar e começar de novo, exercitando o empreendedorismo.” Segundo Varela, um diferencial da geração Y é a facilidade de adaptação, característica importante numa economia muito mais dinâmica. Mudar tudo de uma hora para outra com a proposta de se adaptar ao mercado não é problema para eles, acostumados a acompanhar de perto as constantes transformações tecnológicas. Que se faça a revolução.

Fonte: Blog Salomão Medeiros – Cléia Schmitz